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segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Carlos Queiroz não presta mesmo para nada

Quem o diz é António Manuel Pacheco Domingos. De forma assombrosa e sem medo, característica que sempre esteve presente neste antigo internacional português que tinha um pé esquerdo como poucos. Vale a pena conferir a entrevista.
  
A carreira que nasceu em Portimão, cresceu na Luz e morreu em Alvalade
É dia de Portimonense-Benfica e nada melhor do que falar com quem esteve nos dois lados da barricada. António Pacheco, sportinguista de coração, recorda uma carreira que arrancou na Luz com o "inteligente" Eriksson e que acabou no Sporting com o "incompetente" Queiroz. "Foi com ele que começou o meu declínio", diz. Anda, Pacheco.

Com apenas um ano de primeira divisão, passou de Portimão a Lisboa.

Em 1986/87 joguei na primeira divisão no Portimonense e no ano seguinte fui para o Benfica. Lembro-me de ter jogado duas vezes com o Benfica no intervalo de uma semana e deve ter sido isso que me levou para a Luz. A adaptação foi difícil porque eu sofria de pubalgia e tal... Havia clubes interessados em mim, alguns que até me davam o dobro do que fui ganhar em Lisboa, mas optei pelo Benfica. Fiz quatro malas e fui de comboio ter com um amigo a Lisboa e vivi com ele até ter a minha independência. Porquê o Benfica? Porque tinha valor para ser titular e eu, sportinguista, confiava no sucesso do clube. É que o que dava a ganhar dinheiro era o prémio de jogo - por cada vitória, o jogador que participasse recebia 500 euros.

E a adaptação a Lisboa e ao Benfica?

Difícil, porque estava limitado por causa de uma pubalgia. Mas também não era fácil, porque estava sozinho numa cidade como Lisboa. Era como sair de uma aldeia para outro país. Não se esqueça que não havia nada, só a televisão. Ficava em casa a ver TV no início. Telemóvel não havia e se quisesse falar com outras pessoas ou combinar tinha de estar em casa. E como não tinha carro próprio tinha de andar de transportes. De táxi, que os autocarros tinham números a mais e baralhavam-me. Depois, no clube, também não foi muito fácil. Os mais velhos, os consagrados, não davam confiança aos mais novos, cada um tinha o seu lugar marcado nos balneários, nos autocarros, nas mesas. A maioria deles nem me conhecia e os plantéis tinham trinta e tal jogadores - não se esqueça que havia o campeonato de reservas, para onde fui parar nos primeiros meses. O respeito conquistava-se, meu amigo. Quando íamos jogar fora, tínhamos de esperar que jogadores como o Bento, o Chalana, o Shéu, o Diamantino, o Águas ou o Carlos Manuel escolhessem o lugar no balneário. O meu lugar era sempre aquele que sobrava [risos], era onde me deixassem sentar. E esses eram gajos de quem eu coleccionava as caras nos cromos para as cadernetas um ano antes - a minha vida realmente mudou muito. Mas lá fui começando a jogar com o Skovdahl [treinador dinamarquês mais tarde substituído por Toni] e quando perceberam que podia ser decisivo para o grupo, acolheram-me. Fora dos treinos, andava com o Dito e nos dias de folga era certinho, íamos a este ou aquele bar ou discoteca beber uma cervejinha.

Nessa época (1987/88) chegou à final da Liga dos Campeões, com o PSV e o penálti falhado de António Veloso.

Foi um jogo muito táctico - eles tinham uma grande equipa, com vários internacionais holandeses e dinamarqueses. Aguentámos 90 minutos, 120 minutos, e perdemos nos penáltis. E eu nesse jogo até tive uma oportunidade de golo numa correria mas saltou-me a chuteira na altura de rematar! [risos] Caramba! Andávamos à procura de um golo e eu quando mais precisava saltou-me a bota, o pneu. Fiquei sem aderência [gargalhada]. Era muita velocidade para aquelas botas! Depois, fiquei triste pelo Veloso porque ele era como um relógio suíço: nunca jogava mal, era sempre certinho e fiável. Mas foi pena, porque só sofremos um golo nessa campanha europeia e foi o pai do Gudjhonsen [Arnor] a marcar-nos de livre pelo Anderlecht.

Depois vem Eriksson, com quem manteve uma relação curiosa.

Sempre me dei bem com ele. O Eriksson gostava muito de falar comigo à parte, chateava-me muito a cabeça com isto e aquilo porque acreditava no meu talento. Dizia que eu tinha grandes condições para ser dos melhores. Só que eu era muito teimoso - sempre fui - e não gostava nada que ele me andasse a repreender à frente do resto do plantel. "Este gajo não gosta de mim", pensava eu. Só que depois, lá me caía a ficha e compreendia o que ele queria dizer com aquilo.

Ele filmou um treino seu, certo?

Ahh [gargalhada]. Essa é uma história muito engraçada e mostra a capacidade intelectual do Eriksson. Ele lá deve ter compreendido que isto não ia lá só com palavras. Foi num dia em que tivemos dois treinos: o primeiro, de manhã, foi muito físico, a puxar pelo corpo. O segundo foi mais descontraído, com um meinho, uma pelada, coisa leve. E ele pôs o adjunto Jorge Castelo a filmar esse treino com uma câmara, escondido numa bancada a focar o que eu andava a fazer num plano muito fechado. E eu 80% do tempo da filmagem andava a passo [gargalhada]. Ele mandou fazer a cassetezinha e chamou-me ao gabinete: "Tenho aqui uma coisa para oferecer-lhe." E eu a pensar com os meus botões: "Ai, o que é que este gajo vai agora inventar?" Lá fui e ele deu-me uma cassete de vídeo embrulhada: "É o vídeo de um filme que gostaria que você visse." E eu: "Mas para quê? Bom... Ok, tenho lá um vídeo em casa, vou ver." Vi a filmagem e lá andava eu a passo no meinho e na peladinha. Depois, o Eriksson voltou a chamar-me: "Então, gostou do que viu?" E eu: "Não, não gostei." E ele respondeu: "Por isso é que você não joga tanto: tem de deixar de andar a passo e correr mais." Há uns tempos reencontrei-o: ele veio cá a Lagos e entrou num táxi com uns amigos suecos a perguntar onde é que se podia beber um copinho (e talvez outras coisas mais depois disso [risos] mas isso já não era comigo). O taxista disse-lhe que conhecia um sítio calmo e que o dono era o Pacheco. E o Eriksson perguntou-lhe "Que Pacheco?" e o taxista respondeu: "O Pacheco do Benfica."

E a outra final perdida, com o Milan?

Custou-me muito mas aquele era o Milan de Van Basten, Gullit, Rijkaard, Baresi, Costacurta, Maldini...

Porque saiu do Benfica?

As pessoas dizem que foi por dinheiro mas não foi. O problema é que o grupo começou a ficar dividido quando os russos chegaram. Eles tinham atitudes dentro e fora do clube que não eram bem vistas pelo grupo dos mais velhos. Eu já tinha seis anos de Benfica e sabia o que era a mística que se andava a perder. O Paneira, por exemplo, andava a ser mal tratado. Foi o início da presença dos agentes de futebol, que exigiam que os seus jogadores fossem titulares. Mais: foi a altura em que os jogadores deixaram de ser jogadores para se tornarem "activos". Eu gosto muito do Toni, sempre gostei, mas às vezes a costela benfiquista dele falava mais alto do que a equipa. O Rui Costa estava na nossa linha contra essas coisas: os directores protegiam o Kulkov e o Yuran e diziam que a culpa era dos mais velhos. Decidi sair antes do "Verão Quente", não sabia para onde ia e só falaria com outro clube quando estivesse fora da Luz. Só que era complicado porque tinha dois anos de contrato - foram os problemas financeiros que me deram uma razão legal.

Chegou ao Sporting de Robson com uma equipa de talentos que não deu em nada.

A coisa começou a correr mal no dia em que o senhor Sousa Cintra decidiu chamar o "visionário mor" do futebol.

Carlos Queiroz?

Claro! E vinte e tal anos depois nós vemos que tipo de relação tem com os jogadores, os jornalistas... E com ele próprio: o homem está em guerra com ele próprio. Tudo o que aconteceu com a selecção agora eu previ. Ele é horrível: em termos de relações humanas ele está completamente desadequado com a posição que ocupa. Fazia chantagens, diferenciava os jogadores... Era mau. Lembro-me que deixei de ir à selecção porque ele era seleccionador: eu pedia ao Toni para dizer-lhe para não me convocar porque vinha de lá completamente desorientado. Ele trata os jogadores de forma simpática mas, na minha opinião, muito cínica. Certa vez tive um processo disciplinar imposto por ele no Sporting. Nesses casos temos de arranjar testemunhas e eu escolhi três colegas meus. E o Queiroz disse a um deles que se fosse testemunha não lhe renovaria o contrato. O processo disciplinar dizia que eu faltara a uma convocatória. E que convocatória foi essa? Dormir no hotel! Só que essa convocatória não foi feita de forma oficial e curiosamente foi numa noite em que ganhámos ao Benfica por 1-0, no dia do meu aniversário. Eu, que nunca era convocado para nada, fui convocado para ir dormir no hotel! Houve também um jogo, para o qual não fui convocado, nas Antas, em que houve confrontos porque os jogadores não o queriam ouvir sequer no balneário, ao intervalo. Dá-me a ideia que houve quem se recusasse a jogar. Ele não tem a mão em plantel nenhum.

E porquê essa ironia quando fala dele como "visionário"?

Oh! Então ele não se auto-intitula um visionário do futebol? Ele faz projectos para dez anos, não é? Está-se mesmo a ver que no Mundial-2018, que pode ser organizado cá e para o qual Portugal é automaticamente apurado, o mérito será todo dele mesmo que o Mourinho seja o seleccionador na altura. O sucesso não será fruto do trabalho do Mourinho mas do que ele andou a fazer aqui em 2010, obviamente - é assim que o Queiroz pensa. O currículo dele é uma Taça conquistada frente ao Marítimo. Resumindo: o Queiroz não presta mesmo para nada.

Arrepende-se de ter saído do Benfica.

Desportivamente, claro. A minha carreira morreu no Sporting. Mas também a culpa foi minha porque quis sair do Sporting: devia tê-lo deixado cair sozinho. Graças a Deus nunca mais falei com ele. Saí do Sporting e tentei a minha vida no estrangeiro porque em Portugal estava queimado por aqueles que estavam ligados ou ao Benfica ou ao Sporting. Fui para Inglaterra e andei à experiência no Aston Villa do Yorke e do Southgate e não deu em nada; depois estive quatro meses no Nottingham e fiz uns jogos de reservas. Voltei com a noção de que não ter um empresário me tinha prejudicado. Até que o João Alves me chamou para o Belenenses, uma decisão que me parecia boa mas que correu mal por questões pessoais que não quero, não posso adiantar. Tem a ver com o treinador.

Não pode ou não quer?

Não quero, não insista.

E como é que apareceu a Reggiana?

Um empresário ligou-me e eu fui lá para fazer uns testes. Não sei porque carga de água é que se lembraram de mim mas enfim, foi bom. Deram-me um contrato de um ano com o compromisso de que se não rendesse nos primeiros três meses sairia do clube. Fiquei e ainda fiz 17 jogos, a jogar ao lado do "El Tren" Valencia que era louco. Depois, voltei quando a Reggiana desceu de divisão e ainda tive uma passagem pelo Santa Clara e uns tempos divertidos no Atlético e no Estoril.

Por gozo, que o pé-de-meia estava feito.

Completamente. Já tinha os meus investimentos e um dinheirinho de parte. Os últimos tempos foram para me divertir. Depois pendurei as botas e ainda treinei o Portimonense. Mas não me considero treinador porque não ando à procura de clubes para trabalhar. Se aparecer um, tudo bem. Senão, tranquilo na mesma porque tenho o meu bar-restaurante que me dá muito trabalho (não sou patrão de ficar por casa) e sou representante de uma marca de aquecedores de baixo consumo. 
Fonte: Jornal i

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